Poema de Passagem
(Reginaldo Schittini, professor, escritor e neto de Camilo Mercante e Izabel; O Porta-Voz, no. 705, 16/11/2009)
Algumas cigarras insistem: o silêncio não se rende.
Silêncio este morno, de mormaço no início da tarde;
árvores imóveis quase como de pedra ruas ermas
vidas sufocadas de tédio, mesmice e carência de
qualquer esperança.
As matriarcas perdem mesmo suas belezas de mato,
folha e seivas.
Anjos verdes, dementes elas na algazarra:
não temos frutas maduras
a época das mangas ainda tarda.
Um berro também enlouquecido, endemoniado
tenta quebrar tal silêncio:
apenas arranha o vidro espesso destas horas paradas.
Mas é dia de domingo, eu
derramando esta escrituração toda (inútil palavra?)
porque não percebo araras azuis
perto daqui, na quase-roça,
porque já me cansam as clássicas e as repetições.
O silêncio se deixa influenciar
então por nuvens douradas
arabescas carmim, outras tanto rubras.
Patos selvagem vão seguindo para longe
antes que anoiteça de vez
sobre a solidão essencial de cada um.
Fonte: "Logradouros de Miracema", volume II, edição eletrônica, capítulo CMR, Rua Camilo Mercante.
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