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sexta-feira, 27 de maio de 2011

JOSÉ SERRA EXAGEROU?

A política é uma graça, enfiar a mão em cumbuca no meio político é sempre perigoso, podemos encontrar a qualquer momento uma caixa de marimbondos. A cada eleição que se encerra, no dia seguinte, nova campanha se inicia com todo fervor pelos meios de comunicação e pelas mais variadas formas de alcançar o eleitor. O perigo está na desatenção deste. A oposição ao governo Dilma vem marcando os temas econômicos no discurso como tiro ao alvo.
O candidato derrotado à presidência, o tucano José Serra, criou um blogue. Recentemente ele escreveu não só no blogue, mas em matéria publicada na Folha de São Paulo, sobre a ameaça de desindustrialização brasileira. Esse fato tem sido muito falado pelos quatro cantos, em virtude da valorização cambial e das elevadas taxas de juros brasileiras, que prejudicam as exportações e os investimentos.
No último dia 26, Serra divulgou em seu blogue um artigo intitulado "A indústria faz a diferença", onde relata o problema da desindustrialização. Não tenho a menor pretensão de desafirmar o que disse o ilustríssimo tucano, porém não posso deixar de relatar uma inconsistência citada por ele:
A insensatez é tamanha que o Brasil, hoje, exporta celulose para a China e começa a importar papel de lá.
Não estou aqui colocando por terra todo o arcabouço conjuntural e econômico relatado por Serra, mas quanto à indústria de papel e celulose, que ganhou nos últimos anos grande competitividade internacional, a mera afirmação de que vendemos celulose e compramos papel, como uma caracterização da balança comercial desfavorável, compramos o produto industrializado e vendemos matéria prima, entendo indevida.
O Brasil é hoje o maior exportador e produtor de celulose de fibra curta, oriunda do eucalipto, por vários fatores, entre eles, vantagens comparativas relativas a nossa natureza e território vasto. A celulose de fibra curta, a partir do eucalipto, foi desenvolvida por brasileiros e hoje é um sucesso internacional. Inclusive não é só para a China que exportamos, nosso maior consumidor é a Europa.

Dados extraídos do sítio da Bracelpa
Para quem não conhece, o mercado de papel se utiliza de celulose de fibra curta para produzir papéis que não exigem grande resistência ao rasgo, em geral, após desenvolvimento da tecnologia brasileira de produção de celulose a partir do eucalipto, o eucalipto é a principal fonte. Somos o maior produtor desse tipo de celulose utilizado para confecionar papéis de imprimir e escrever e outros de menor resistência ao rasgo. Já a celulose de fibra longa é utilizada para produzir papéis que necessitam de maior resistência ao rasgo, em geral para utilização em produtos de embalagem.
Nos últimos anos com a pujança da economia chinesa, aquele país também investiu em plantas de fabricação de papel e tem o Brasil como maior fornecedor de celulose de fibra curta. Assim como os chineses penetram no nosso mercado com seu papel, também exportamos papel para a China.


Por outro lado, verificando dados da Bracelpa, com relação à Balança Comercial do setor de Papel e Celulose, encontrei dados que não conferem com a informação e exemplificação divulgadas pelo tucano.


O Brasil exporta mais papel do que importa. Em relação à celulose, a importação brasileira é ínfima, relaciona-se à celulose de fibra longa, originária do Pinus. Nosso país tem um consumo de papel inúmeras vezes menor do que países centrais, o que denota grande potencial de mercado consumidor, que deverá se ampliar com o seu desenvolvimento econômico-social e por isso o interesse dos estrangeiros. O fato é que a importação de papel chinês, no nosso caso, deve-se à competitividade existente no mercado, que inclusive beneficia os consumidores e ajuda a regular os preços do setor.
O mercado da celulose é tão insignificante, diria o tucano, que a Votorantim, empresa que atua no mercado mais recentemente que a histórica Cia. Suzano, p. ex., decidiu se dedicar à celulose, tendo vendido várias plantas de fabricação de papel, a mais recente foi a venda da Conpacel para a Cia Suzano. Hoje, a VCP é dona de grande parte do capital votante da Fibria, ex- Aracruz, e tem investido maciçamente na produção de celulose e em florestas de eucalipto.
Apesar dos argumentos conjunturais serem um alerta que vem se firmando, que qualquer político que estivesse no poder teria que encarar devido ao dinamismo econômico, não poderia deixar de fazer essas observações.
Parte do sucesso dessa indústria começou lá atrás, com empreendedorismo, com planejamento e estímulo governamental, através dos antigos PND´s e também de investimentos e fomento do BNDES. O papel imprensa é um gargalo que justifica parte de nossas importações hoje.
Não é pretensão, repito, desafirmar o texto do tucano, mas o exemplo utilizado não é condizente, é um exagero.

Atualização às 21h: inclusão da última frase no primeiro parágrafo, por questão de clareza.

7 comentários:

Luiz Carlos Martins Pinheiro disse...

Amiga Angeline

Deste assunto certamente entende muito mais do que nós, portanto, não vamos nos enrolar nele.

Mas veja que a indústria brasileira foi capaz de produzir trens de metro de última tecnologia e que ai estão mostrando a sua qualidade até hoje e bem antes disto trens suburbanos, bem como trens de passageiros de longo percurso, até mesmo locomotivas elétricas e dieseletricas.

Hoje estamos importando tais trens da China, com qualidade muito temerosa. O que de melhor eles oferecem é provávelmente preços menores e financiamento. Quanto a este temos o BNDES. Certamente tivemos só ai uma baita desnacionalização industrial, que efetivamente se iniciou antes da última década e que se está agravando.

Abraços, saúde e Paz de Cristo.
Luiz Carlos/MPmemória.

AngelMira disse...

Caro Luiz Carlos:
No caso que citou e em inúmeros outros ocorre mesmo a falta de pesquisa, de inovação e de investimentos. Certamente. Só destaquei o caso do setor de Papel e Celulose para destacar a infelicidade do exemplo citado pelo tucano. E também destacar que os produtos commodities também possuem tecnologia.
Não contradigo a conjuntura e todo o arcabouço, mas o caso peculiar da indústria de papel e celulose, não serve de exemplo.
Na década de 90 as indústria de papel européias fecharam várias plantas, são grandes consumidores hoje da celulose de eucalipto e são grandes produtores de papel e o Brasil os importa. Nem por isso estamos na desindustrialização. Os números estão aí.

Luiz Carlos Martins Pinheiro disse...

Amiga Angeline

Obviamente pode-se ter a perda de um setor industrial por inúmeras razões.

O do material e equipamento ferroviário é incrível.Surgiu com a II Guerra Mundial, em geral, em dependência das ferrovias e se transformou em grandes e modernas fábricas, como a COBRASMA, MAFERSA, FNV etc.

Foi capaz de fornecer moderníssimos trens aos metros de SP e do Rio, que estão ai em funcionamento. O de SP com uma euipe técnica de primeiríssima a cada nova compra foi mais exigente, inclusive em termos tecnológicos.

Certamente ainda estivesse como na época estaria perfeitamente capacitado a trazer ao Brasil o TAV, sem precisar da idéia mirabolante de um estatal para isto, consorciados com os donos de tecnologia do mesmo.

Só não chegara a adquirir competividade em preços e financiamentos para concorrências no estrangeiro.

Vemos lideres da industria falando de fábricas que estão se transformando em meras montadoras ou mesmo apenas vendedoras de produtos que são importados por preços que não têm como competirem.

Obviamente se não temos condições de concorrer, pode ser melhor ao Brasil importar, mesmo causando desempregos e perdas de impostos.

Este contudo não é caso da nossa indústria ferroviaria, com mão-de-obra de elevada capacitação e com os empregos indiretos que oferece, mesmo que para isto se precise aliviá-la da nossa elevadíssima carga de impostos.

Abraços, saúde e Paz de Cristo.]
Luiz Carlos/MPmemória.

AngelMira disse...

No caso da ferrovia creio que foi uma escolha. O país optou pela rodovia e ignorou a ferrovia, abandonando-a em prol da indústria automobilística e otras cositas, não?

Luiz Carlos Martins Pinheiro disse...

Amiga Angeline

Sem dúvida.

Mas perder uma indústria com a capacitação da nossa, foi dose dupla.

Tinha uma elevada tecnologia. Com isto não queremos dizer projetos, manuais e outros documentos, mas cérebros capazes de fazê-los e principalmente de avança-los.

Veja o quanto estamos pagando para obter a do TAV e será que obteremos mesmo, do jeito que imaginam?

Conhecemos a essa indústria por dentro, trabalhando com sua gente. Não estamos falando por ter ouvido dizer etc.

Abraços, saúde e Paz de Cristo.
Luiz Carlos/MPmemória.

Blog "O Vagalume" disse...

Luiz Carlos,
Sei o quanto conhece o tema das ferrovias. Creio que o abandono da ferrovia nos custará caro hoje e no futuro, até que consigamos rever esse atraso.
Infelizmente, até o TAV é levado para o discurso politiqueiro, sem analisar a questão de forma PROFISSIONAL e com olhos no interesse coletivo.
Foi justamente por isso que destaquei nessa postagem o tema da indústria de papel e celulose.
Lamentavelmente, estamos assistindo no país, a uma guerra política, com olhares eleitorais, que a tudo criticam sem observar o bem comum.
Criticam o TAV, fazem campanha para incutir nas pessoas as expectativas inflacionárias e a lista é grande.
Torço para que o nosso país possa reconquistar a ferrovia, que é marcadamente pelo mundo afora a solução do transporte. Como bem sabe, sou partidária da mesma opinião que a sua, com todos os limites a que me reservo, pois não tenho a vasta experiência que você tem.
Certamente, os velhos tempos, em que era orgulho ser funcionário da RFFSA, quem sabe voltará um dia... E teremos novamente os trens, já mais modernos, contribuindo para o meio ambiente e facilitando a mobilidade urbana, rural, da indústria etc.

Luiz Carlos Martins Pinheiro disse...

Amiga Angeline

Curiosasmente vemos que até parlamentares já se arvoram em defender ferrovias ao Brasil. Até bem recentemente nelas nem para falar mal.

Mas nos preocupa que ainda as vêem como foram em tempos idos. Isto só faz sentido a trens de turismo ou seja de preservação da memória ferroviária.

Precisam ser vistas como sistema competitivo com outros modais, formando a base aos nossos transportes e não apenas como meio de transpotre de cargas que necessitam de baixas tarifas, como em verdade nos parecem nossas atuais ferrovias.

Evidentemente uma rede de TAV, complementada por serviços de passageiros da mais moderna tecnologia, mas de velocisadade mais baixas.

Estamos sonhando muito.

Abraços, saúde e Paz de Cristo.
Luiz Carlos/MPmemória.

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