Primeiro Campo de Aviação de Miracema, construído na década de 1940. Hangar, no Alto do Cruzeiro. Foto: acervo de Carmem Lúcia Macedo Lima. Divulgado no Facebook por Tadeu Miracema. |
Muitas postagens nesse blogue são construídas assim, através de bate-papos nas redes sociais. Hoje flagrei na página do blogueiro Ademir Tadeu, do Blog Tadeu Miracema, um bate-papo sobre os campos de aviação de Miracema. Lá vamos nós! Super atual o tema.
Após a Segunda Guerra Mundial houve grande desenvolvimento técnico da indústria aeronáutica mundial surgiram aviões maiores e mais seguros. A partir dai houve uma expansão do treinamento de pilotos no Brasil, cuja formação foi incentivada por meio da campanha “Dêem Asas ao Brasil”, lançada pelo Ministério da Aeronáutica na década de 1940, em cuja organização o Aeroclube do Brasil teve um papel fundamental (FAY e FONTES, 2017).
Também conhecida como Campanha para Dar Asas a Juventude Brasileira ou Dêem Asas ao Brasil, a CNA [Campanha Nacional de Aviação, criada em 1941] contribuiu de forma determinante para que o número de aeroclubes passasse de menos de quarenta, na década de 30 para cerca de quatrocentas destas instituições espalhadas por todo o país. Deve-se destacar, no entanto, que este estímulo para a consolidação de uma mentalidade aeronáutica junto à juventude brasileira tinha uma preocupação real com a guerra e, portanto, era preciso criar um exército aeronáutico de reserva, convocando os jovens da sociedade a se engajarem em campanhas em prol da aviação e que pudessem se incorporar à aviação militar, se necessário. A fim de facilitar a formação desta reserva aeronáutica, o governo responsabilizou-se pelo pagamento de horas de voo nos aeroclubes e escolas de voo (Ibid., s/p).
O Aeroclube de Miracema foi criado na década de 1940, cujo campo de aviação, o primeiro da cidade, foi construído no bairro Alto do Cruzeiro, em terreno doado por Homero Mendes Linhares, irmão do então interventor Altivo Mendes Linhares.
Segundo o cronista Erasmo Tostes, a construção aconteceu por meio de algumas atrocidades: "Tenente Coracy, que trouxe para nossa cidade muitos presidiários que trabalhavam na construção do campo, cujo trabalho foi feito à base de enxada, enxadão e carroças de burro, causando a morte de vários presidiários que usavam apenas calção e camiseta vermelha, alojados na antiga cadeia na Rua das Flores".
Volto à prosa no Facebook do Tadeu Miracema, para registrar importante depoimento do jornalista José Maria de Aquino:
Eu era criança - nasci em 1933 - mas me lembro bem. Os presos vestiam apenas um calção azul e uma camiseta regata vermelha, roupa que com o tempo foi desgastando e alguns pareciam praticamente nus. Por onde passavam - rua das Flores, praça da antiga prefeitura, ao lado da Igreja, e subiam na direção do cruzeiro, as famílias fechavam portas e janelas. Os sinos da Igreja tocavam, por ordem do padre Nicodemos, eram muitas as reclamações enviadas ao interventor do Estado, Amaral Peixoto, genro do ditador Getúlio Vargas, mas nada adiantava. Só mesmo quando um dos presos morreu, de isolação (sic). Foi feita sindicância e descobriu-se que nem todos os presos, trazidos pelo Coronel Coracy, tinham cometido algum crime. Que me lembre, apenas um morreu.
Chico Violeiro teria sonhado com um aeroporto lá no topo e levou a idéia para o Altivo Linhares. Bela idéia, se na época usassem máquinas. Coracy foi encarregado de montar um "exército" de homens e prendeu muitos no Estado, trazendo para Miracema. No final, foi apurado que muiitos nada deviam à Justiça - advogados, dentistas...
Erasmo cita ainda que "O primeiro avião a pousar em Miracema foi um paulistinha, com a manutenção feita em Nova Iguaçu. O primeiro Aviador e instrutor em Miracema chamava-se Mac (Meque). Americano alto e louro que fazia acrobacias de todas as maneiras". A escritora Maria Alice Barroso, parece ter se inspirado nesses eventos em seu livro "Quem Matou o Pacífico?", que tem um piloto de avião estrangeiro por personagem em "Parada de Deus".
O cronista cita nomes importantes da terrinha na aviação:
Em 64/65 os Aviadores da época no livro de registro eram - Instrutor e mecânico Andrade que também voava e Hermes Oliveira mecânico. Os pilotos Aldo Cardoso Guimarães – Clovis Helsink Pereira Lima – Djalma Serpa Brandão, Euclides Mendes Linhares (Tetéu) - Jucy Ruy Granato – Marcelo Botelho Tostes – Marcelino Macedo Medeiros – Oswaldo Cardoso Lima (Suísso) - Onofre Simem – Nilson Rodrigues Moreira – Salim Bou Issa – Sidney Natividade Rodrigues – Télio Lontra – Vicente Barros Toscano - Lourival Ferreira Lima (Lourinho) - Alexandre Sampaio de Martino - Nilton Galieta – José Maria Machado - Dinaldo Fernandes (Didi Baiano) - José Lima Rouback – Marcos Faver – Jader Eiras – Cilas Alves Magalhães Ocausma – Helio Tancredi – Geraldo R. Gomide – Carlos Rodrigues Moreira – Waldir Fonseca de Carvalho. Os mais antigos Antonio Tostes (piloteiro) e Geraldo Alvim Tostes. Todos eles com mais de cem horas de voo, alguns com mais de 700 horas. Após esses, José Osvaldo e Julinho que pilotavam um ultraleve.
O sobrinho de um dos pilotos, José Antônio Moreira Pinto, relata: "Nilson Moreira meu tio era piloto e eu voei nesse avião que aí está. Um Paulistinha de dois lugares, prefixo PP CGG. Corrigindo PP GXA", na foto do início da postagem.
Na aviação nacional, consta que em 1943, organizou-se na Base Aérea de Natal uma unidade de treinamento, intitulada USBATU (United States - Brazil Air Trainning Unit) cujo objetivo era oferecer instrução aérea e terrestre aos oficiais da FAB. Havia ainda um projeto da Civil Aeronautics Administration (CAA), responsável pelo Programa de Formação de Piloto Civil nos Estados Unidos, que visava ao uso dos aeroclubes brasileiros para ministrar instrução aos pilotos utilizando exclusivamente aeronaves estadunidenses (OLIVEIRA, 2015 apud FAY e FONTES, 2017).
Durante a CNA, que se encerrou no início da década de 1950, o Brasil teve um acréscimo de mais de três mil pilotos civis e militares formados pelos aeroclubes, apontam Fay e Fontes (2017).
É interessante observar que, embora tivesse sido impulsionada por recursos privados, a CNA não era totalmente controlada por particulares. O Estado controlava todas as atividades dos aeroclubes por intermédio de sua base mãe: o Aeroclube do Brasil. Seu papel era controlar a entrega de aviões, repassar verbas e insumos e formar pilotos para compor os quadros de instrutores dos demais aeroclubes. Além disso, a fim de obter crédito junto ao governo, todos os aeroclubes deveriam filiar-se ao Aeroclube do Brasil [criado em 1911], que por sua vez era filiado à FAI, responsável por homologar as licenças e serviços concedidos pelo Aeroclube (BRASIL, 1939 apud FAY e FONTES, 2017).
Historicamente o aeroclube tem sido a instituição responsável por formar uma cultura aeronáutica no país, fornecendo cursos, treinando pilotos, formando mecânicos e instrutores de voo, bem como oferecendo espaço para eventos na área da aviação. Deve-se lembrar que a formação de pilotos na década de 40 também tinha como objetivo o monitoramento de sobrevoos de aviões inimigos no território brasileiro, pois se vivia a Segunda Guerra Mundial (Ibid.).
Paralelamente às atividades de formação dos instrutores, o Aeroclube mantinha sua missão de fomento à aviação com a manutenção da Escola de Piloto de Recreio e Desporto (hoje piloto privado) e atividades aerodesportivas. Em Manguinhos foi realizado o primeiro Campeonato Brasileiro de Acrobacia Aérea. Ainda na década de 40 foram criados os Departamentos de Paraquedismo e de Aeromodelismo (Ibid.).
Segundo as autoras, apesar da aviação ser vista como um elemento estratégico pelos militares, durante a ditadura militar a subvenção do governo aos aeroclubes foi restringida e muitos deles foram obrigados a encerrar suas atividades. “De repente, tudo entrou num compasso de espera: os hangares foram se fechando, os aviões escasseando, as verbas diminuindo. [...] Poucos aeroclubes recebem minguado auxílio para ajudar no pagamento de mecânicos e instrutores” (AEROCLUBES..., 1971, p. 80). A formação de pilotos civis parecia não interessar aos governos militares que reduziam anualmente as verbas destinadas aos cursos de aerodesporto, como eram conhecidos os cursos de formação de piloto privado no Brasil.
Vista da cidade de Miracema a partir do Campo de Aviação no Alto do Cruzeiro, década de 1960. Foto enviada por um leitor vagalume. |
Referências:
FAY, Claudia Musa; FONTES, Rejane de S. O papel do Aeroclube do Brasil na construção de uma política nacional de aviação brasileira (1911-1972). São Paulo, História, 36, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/j/his/a/qk9RLTKq5Z6BWPv5rGVd8TJ/?lang=pt# . Acesso em: 16-jul-2022.
TOSTES, Erasmo. Miracema e seus Aviadores. Coluna Crônicas do Erasmo. Jornal Liberdade de Expressão, Miracema-RJ.
Facebook de Tadeu Miracema. Disponível em: https://www.facebook.com/photo?fbid=5595691537132269&set=a.726832710684867. Acesso em: 16-jun-2022.
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