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sábado, 9 de outubro de 2010

À espera de Marina

Meses atrás, antes de Marina Silva decidir sua saída do PT e ser candidata à Presidência da República, ela me disse que sentia um “chamamento do Brasil”. Certamente não imaginava, então, que sua campanha deixaria marca tão forte, com vinte milhões de eleitores, ao ponto de deixar os dois candidatos que foram para o segundo turno olhando para ela, esperando um gesto de apoio.
No lugar de ficar “à espera de Marina”, cada candidato deveria observar “a espera da Marina”. Entender o que ela espera deles nestes dias posteriores ao primeiro turno.
Enquanto os candidatos esperam o que Marina vai dizer, ela deve estar esperando o que eles vão propor.
Deve estar olhando qual dos dois candidatos vai lhe permitir optar com legitimidade, diante dos seus eleitores; ou como justificar sua neutralidade, diante de todos os eleitores do Brasil.
É possível que Marina tenha mais simpatia por uma ou por um dos candidatos, mas, neste momento, ela tem compromisso, sobretudo, com suas propostas, sua mensagem, seus eleitores. Seu apoio deve ser parte do chamamento que o Brasil lhe fez.
Quase 50% dos eleitores votaram na Dilma para continuar o que vem sendo feito nos “Anos Lula”, mas 20% votaram na Marina para dizer que desejam mudanças. Ao dar maioria a Dilma, disseram querer continuidade. Mas ao negar-lhe vitória no primeiro turno disseram que não votavam pela continuidade simples, que querem mudanças.
Não viram, nos outros programas, as propostas que desejavam; ou viram, mas não confiaram que elas seriam cumpridas.
Parte dos eleitores quer ajustar o modelo produtivo para levar em conta o equilíbrio ecológico e garantir a sustentabilidade; quer assegurar saúde e educação com alta qualidade para todos; quer mudar a maneira de fazer política para incorporar ética, sinceridade e uma nova racionalidade, menos prisioneira do estatal ou do privado e mais comprometida com o público; menos limitada às próximas eleições e mais comprometida com as próximas gerações. Outra parte dos eleitores da Marina é de pessoas que desejam resgatar valores morais e não aceitam inovações que ultrapassem certos limites.
Para atrair o apoio e os votos da Marina, o caminho é adotar e apresentar com clareza o que o candidato, se eleito, fará para proteger a natureza brasileira contra a depredação provocada pelo crescimento econômico; que fontes energéticas priorizará; como dinamizará a economia e melhorará o transporte sem aumentar a produção de veículos particulares; que medidas usará para substituir o PIB como indicador de progresso; quais projetos de lei enviará ao Congresso para fazer a tão esperada reforma política que elimine a corrupção, como prática corrente da atividade pública; como democratizará o processo eleitoral para evitar a dependência de financiamento de campanha pelo poder econômico; como radicalizar no compromisso de incluir a educação brasileira entre as melhores do mundo, assegurando acesso igual para cada brasileiro, desde seus primeiros anos, independentemente da renda da família ou da cidade onde more; como assegurar água, saneamento, coleta de lixo, atendimento preventivo de saúde e serviços médicos com a mesma qualidade a cada pessoa.
Ao mesmo tempo, assumir o compromisso de não forçar mudanças nos costumes e valores éticos além da capacidade de aceitação do conjunto da população, respeitando os direitos de cada minoria, mas sem ofender os sentimentos da maioria.
Marina está esperando qual candidato vai adotar suas propostas, passando a certeza de que essa adoção é fruto de convicção ou conversão, não um gesto de marketing.
Marina está esperando e seus eleitores também.
Creio que a Dilma Rousseff, por sua história, suas falas e propostas está mais próxima dos desejos dos eleitores de Marina, mas esta ainda está à espera da explicitação das medidas que farão o programa da ex-ministra se aproximar do que a senadora apresentou durante sua caminhada ao atender ao “chamamento do Brasil”.

CRISTOVAM BUARQUE é professor da Universidade de Brasília, senador (PDT-DF), apoiou Dilma no 1º turno e manifestamente apoia Dilma Rousseff no 2º turno.
Esse artigo também foi publicado hoje no Jornal "O Globo".

2 comentários:

Unknown disse...

bom texto, bons argumentos, mas ainda acho que muitos dos eleitores de Marina optarão pela 'neutralidade' no 2º turno

AngelMira disse...

Bom, é uma dúvida. No meu caso, desde o primeiro turno votei nos plebiscitários... não fosse essa circustância teria um voto diferente.

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