ARTIGO - Marcelo S. Tognozzi
Os políticos controlam cada vez menos a política num tempo em que quanto maior a inserção digital de um povo, maior sua capacidade de agir e interagir com independência. Nos Estados Unidos, a campanha eleitoral feita apenas de papel, rádio e TV acabou. No Brasil, estamos indo pelo mesmo caminho, e a eleição de 2014 será muito diferente da de 2010. O jogo político muda velozmente e a capacidade de pronta resposta é necessidade cada vez maior porque o tempo real é o combustível das novas mídias.
Faz tempo que a campanha eleitoral de 2012 está no ar no Twittter, Facebook, Youtube, e-mails e na troca de torpedos. Se alguém duvida, basta conferir o efeito do ativismo digital da campanha “Desocupa Salvador”, movida contra o prefeito João Henrique (PP) e definida por Gilberto Gil como uma “ação da cidadania informada”. Nascida e crescida nas redes e mídias sociais, é um protesto contra a Lei de Ocupação, Uso e Ordenamento do Solo (Louos). O Desocupa Salvador tem obtido efeito semelhante — no âmbito regional — ao das mobilizações nacionais Ficha Limpa e Marcha Contra a Corrupção.
Em outras cidades, campanhas negativas contra prefeitos e políticos se espalham como avalanche. No dia 20 de janeiro, um grupo de jovens guerrilheiros digitais de Canoas (RS) “atacou” a administração do prefeito Jairo Jorge da Silva (PT), transformando a hashtag #MaisHospitaisEmCanoas no trend topic mais comentado do Brasil. Em Niterói, faz sucesso um grupo no Facebook com mais de 8 mil pessoas batizado “Niterói não tem prefeito”, dedicado a desancar Jorge Roberto Silveira (PDT).
Em 2010, alunos da UnB foram pioneiros na bem-humorada guerrilha digital “votoserrapq” e lograram quase 400 mil visualizações num só filme (os arquivos estão disponíveis no You Tube). Essa é tendência que ganha força: a militância conectada consegue produzir campanhas negativas mais eficientes do que a militância off-line. E ninguém segura essa turma. Com todo o respeito, se China e Cuba não conseguiram, a façanha não será da nossa Justiça Eleitoral.
Reforça tudo isso um dado impressionante: a realidade da inserção digital no Brasil, com metade da população conectada, vem produzindo a reforma política que o Congresso e o Judiciário não conseguiram ou não quiseram fazer. De acordo com pesquisa do Ibope de setembro de 2011, o Brasil tem 80 milhões de internautas maiores de 16 anos, ou seja: eleitores. É mais da metade dos 140 milhões de votantes registrados no TSE. São 40 milhões de celulares 3G ativos, conectados com as redes e mídias sociais, e outros 200 milhões que enviam e recebem torpedos. A maioria esmagadora dos brasileiros já é eleitor digital.
A reforma política, realidade para o público conectado, virou o mundo das Suas Excelências de cabeça para baixo. O conhecimento restrito sobre o que são e como funcionam as redes e mídias sociais levou o TSE a proibir o improibível ao mandar o passarinho do Twitter para a gaiola achando que ele era broadcast.
Há grande diferença entre mídia social, rede social e broadcast. Mídias sociais levam informação ou entretenimento, permitem compartilhamento e comentários dos usuários, como nos blogues e no Youtube. Redes sociais são networking, sua base é o relacionamento entre pessoas com os mesmos interesses. Quando políticos publicam comentários no Twitter, pregam para convertidos, falam para as próprias redes de relacionamento num ambiente fechado. O mesmo acontece no Facebook. Não têm o poder de atingir o grande público indiscriminadamente.
Quem faz isso é o rádio, a TV, a grande imprensa porque são essencialmente broadcast: geram e transmitem conteúdo aberto, acessível a todos. Um fato relevante publicado numa mídia social pode acabar na grande mídia, como o caso da estudante paulista Geisy Arruda, agredida pelos colegas que não gostaram da sua minissaia. Alguém gravou a cena e publicou no Youtube. As pessoas viram, comentaram, compartilharam e o caso acabou nos telejornais.
É impossível impedir as pessoas de fazerem campanhas, trocar opiniões, comentários, críticas, ideias, fotos, vídeos e tudo o que circula nas redes sociais e nas mídias sociais. Ou será que o ativismo em Salvador, Canoas e Niterói não têm cunho político? A política da era digital é a do compartilhamento e da participação: todo mundo ao mesmo tempo, todo dia e a qualquer hora à revelia do calendário eleitoral.
MARCELO S. TOGNOZZI
Jornalista, especialista em novas mídias e comunicação digital
tognozzi@gmail.com
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