/ê/
substantivo masculino
- 1.pequena sala, isolada do conjunto de uma habitação, destinada, sobretudo, a trabalho.
- 2.local destinado exclusivamente ao trabalho; escritório.
Uma breve pesquisa no Google e a primeira definição que apareceu pra a palavra gabinete é a que colei acima. É o sentido denotativo da palavra, no sentido laboral, de escritório, de administração. No entanto, existem vários sentidos diferentes, tanto denotativos quanto conotativos.
Durante a minha caminhada convivi com alguns desses sentidos. Primeiro, na escola, gabinete era o habitat da direção da escola. Quando éramos chamados lá, boa coisa não era. Fui chamada lá uma única vez, por conta de um desencontro que tive com a filha da diretora. Era criança, do primário, então, sem entender bem o que era arbitrariedade, reagi dizendo que a diretora estava protegendo a filha e tudo se resolveu, afinal, era coisa de criança.
Fui crescendo e me deparei com outros sentidos da palavra. Já na década de 90, fui apresentada ao gabinete do computador, uma máquina que prometia avanço substancial no trabalho e na vida em sociedade, outro significado denotativo da palavra.
Cheguei a pegar um chefe que tinha gabinete isolado, coisa que logo em seguida caiu em desuso. Ele era muito vaidoso e educado. Sempre que fui acionada "ao gabinete", fazia questão de bater à porta para que ele me autorizasse a entrar... Foi por pouco tempo, infelizmente, era competente, mas ficou muito doente e acabou deixando o posto e sendo substituído por outros que não se utilizavam desse artifício que significava poder, status.
Das lembranças que tenho em mente, uma abordagem diferente da palavra congrega os dois sentidos: conotativo e denotativo.
Um líder político, que circulava nas redes sociais, tratava de um trabalho feito com recursos do estado, que iria asfaltar as ruas da terrinha. Informação pra lá e pra cá, notei que um trecho tombado pelo patrimônio histórico e cultural, pelo Estado inclusive, seria asfaltado. Questionei nas redes sociais, ele tentou argumentar até que considerou que iria analisar o caso. Finalmente, convidou-me ao gabinete!
...
Recentemente, pela imprensa, é divulgado a todo momento um gabinete paralelo no governo federal. Essa situação denota que há um grupo, que orienta o governo paralelamente às instâncias do primeiro escalão. Caso que chamou a atenção com a instalação da CPI da Covid, envolvendo questões do Ministério da Saúde.
Por outro lado, a CPI das Fake News tem como investigação central um tal "gabinete do ódio", que coordena a campanha midiática e fake do atual governo central.
...
Quando convidada ao gabinete pelo líder político, notei que o interlocutor queria colocar fim no diálogo público, para não se expor. Além disso, o convite "venha ao meu gabinete..." soa como forma de demonstrar quem tem o poder.
Recentemente, um agente público ordenou medida que me pareceu arbitrária, num ato de fiscalização de manifestação política. Afinal, a informação publicizada pelos manifestantes era de que haviam impedido parte da mobilização proposta, com discursos e paradas em pontos estratégicos, por conta de um suposto decreto municipal inexistente até hoje. Puseram a pauta nas redes sociais e comentei: "parece arbitrário". O agente público me questionou o motivo da opinião. Troca de comentários para lá e pra cá, até o momento o agente não informou qual a legalidade do ato ordenado por ele, apesar de várias indagações a respeito, que se fossem respondidas colocariam areia sobre a discussão. Insisti e finalmente a frase mágica: "venha ao meu gabinete... te mostrarei todos os documentos".
Assim, além de demonstrar poder, esse convite é uma forma de intimidação. Coisa não muito sensata numa democracia.
Espero que surjam sentidos melhores para "gabinete", como gabinete do orçamento participativo, gabinete de participação popular, gabinete de projetos e cidadania... De portas abertas à população.
No mais, os sentidos estão anacrônicos e autoritários em sua maioria.
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