Por Alexandre Santini
A luta do setor cultural pela Lei Aldir Blanc atravessou todo o ano de 2020. Após aprovação no Congresso Nacional no mês de junho em tempo recorde, fruto de grande mobilização nacional, os percalços começaram já no processo de sanção presidencial e regulamentação federal. Ao todo, este processo levou cerca de 90 dias, demora injustificável para uma política emergencial. Apesar da enorme mobilização e dos resultados expressivos na transferência dos recursos a estados e municípios (atingindo a quase totalidade dos R$3 bilhões previstos na Lei), os prazos apertados e as inúmeras dificuldades das gestões locais tornaram muito complexa a chegada efetiva destes recursos aos seus beneficiários em tempo tão curto.
Nas últimas semanas, foram intensos os esforços de parlamentares, gestores públicos de cultura e agentes culturais de todo o país que se mobilizaram exigindo uma prorrogação dos prazos de execução de da Lei Aldir Blanc que conseguisse abranger todo o volume de recursos transferidos aos entes federados em 2020.
Lamentavelmente não foi esta a decisão do governo federal. A MP sancionada e publicada prorroga os prazos, mas afirma que “ serão considerados apenas os recursos que tenham sido empenhados e inscritos em restos a pagar pelo ente responsável no exercício 2020.” Esta redação restringe bastante as possibilidades da prorrogação. Na sequência, um parágrafo único estabelece que, nos empenhos, deverá constar já o nome dos beneficiários - pessoas ou grupos aprovados em processos seletivos- que irão receber os recursos. Os valores não enquadrados nessas categorias terão que ser devolvidos ao Tesouro Nacional após o dia 31 de dezembro de 2020.
Na prática, esse dispositivo impede a realização de novos editais em 2021, bem como dificulta a reprogramação da utilização de recursos, pelos estados, das verbas não empregadas pelos municípios. O problema se torna mais grave nas cidades menores e no interior do país. Mais uma vez, o que se perde com esta decisão é a possibilidade de ampliar a descentralização da distribuição dos recursos de fomento à cultura no Brasil. Perde o Sistema Nacional de Cultura e perde a sociedade brasileira.
A perspectiva de devolução de parte significativa desta verba emergencial ao Tesouro Nacional é uma amarga notícia para trabalhadores e trabalhadoras da cultura em todo o país, no apagar das luzes de um ano já tão difícil. A Lei Aldir Blanc foi a única política cultural, de iniciativa da sociedade e do parlamento, que garantiu investimento em larga escala a um dos segmentos mais atingidos pelas consequências sociais e econômicas da pandemia.
O balanço final de quanto será efetivamente executado e de quanto terá que ser devolvido à União só poderá ser feito após a virada do ano. Até às 23h59 do dia 31 de dezembro deste 2020 infinito, há um mutirão nacional para tentar garantir o empenho e a execução desta verba em benefício do setor cultural. Mas não se pode negar os resultados altamente expressivos e os números eloquentes de execução dos recursos da Lei Aldir Blanc, em um país de dimensões continentais, injusto e desigual como o nosso. Serão muitas as experiências e os aprendizados deste processo, que segue sendo um divisor de águas na história das políticas culturais no Brasil.
A luta seguirá em 2021, para que os recursos devolvidos sejam reinvestidos na cultura de forma abrangente, universal e descentralizada. Ninguém solta a mão de ninguém!
#LeiAldirBlanc2021
Escola de Políticas Culturais
Articulação Nacional de Emergência Cultural
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