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domingo, 30 de maio de 2021

LIVRO RARO PUBLICADO EM 1894 TRAZ REGISTROS HISTÓRICO-CULTURAIS DO NOROESTE FLUMINENSE

O lançamento de Rumorejos do Monte Himalaya, da Essentia Editora, integrou a programação da VII Mostra do Conhecimento do IFF Bom Jesus, realizada de 23 a 28 de setembro.

por Ana Paula Giori Fassarella / Comunicação Social da ReitoriaPublicado30/09/2019 12h00,Última modificação16/10/2019 11h47

Aspectos da natureza tropical exuberante do fim do século XIX e reflexões sobre questões e transformações históricas, culturais e sociais da época são alguns dos temas encontrados no livro Rumorejos do Monte Himalaya, obra publicada originalmente em 1894 por Amelia Gomes de Azevedo. A autora era natural da região da fazenda Monte Himalaya, localizada onde atualmente é o limite entre os municípios de Bom Jesus do Itabapoana e Itaperuna, interior do estado do Rio de Janeiro.

Devido à identificação da autora com a região, a Essentia Editora do Instituto Federal Fluminense (IFF) e o Projeto de Extensão “Café com Letras” realizaram o lançamento da obra Rumorejos do Monte Himalaya, quinto volume da Série Memórias Fluminenses, na última sexta-feira, 27 de setembro, durante a VII Mostra do Conhecimento do IFF Bom Jesus.

A temática do livro, o contexto da escrita em fins do século XIX e a biografia da autora foram alguns dos assuntos abordados na mesa, bem como os aspectos sobre o processo de elaboração de uma obra rara e os caminhos da tradução do texto em francês da publicação. Participaram da mesa uma das editoras científicas da Essentia, editora da Série Memórias Fluminenses e uma das organizadoras de Rumorejos do Monte Himalaya, Paula Borges Bastos; outro organizador da obra e tradutor dos textos em francês, o professor de Línguas Neolatinas da UFRJ, Pedro Paulo Catharina; e o professor de História do IFF Bom Jesus e membro do Conselho Editorial da Série Memórias Fluminenses, Rogério Ribeiro Fernandes.

Rumorejos do Monte Himalaya é o primeiro livro da escritora Amelia Gomes de Azevedo, que viveu entre 1866 e 1929, sendo atualmente considerado uma obra rara. Dividida em duas partes, contém textos publicados pela autora em diversos periódicos nacionais, bem como textos em francês pelos quais recebeu prêmios e menção honrosa em concursos literários na França e na Bélgica. “Nós fizemos uma cópia, uma nova edição que busca ser muito fiel ao texto original. Então, procuramos usar a mesma ortografia da época. Em todo o texto nós não fizemos uma nova correção para a língua portuguesa de agora, pois queremos manter a essência do texto original. Justamente por ser um livro raro, pretendemos que o público – que muitas vezes é um leitor amador, mas também pode ser um leitor pesquisador – possa ter acesso mais fácil a esse material”.

As narrativas de Amelia são tecidas com um forte componente do romantismo (personagens solitários e sofredores, índio cavalheiresco, exuberante paisagem tropical), além de alguns personagens históricos como Cristóvão Colombo e D. Pedro II. É possível, também, encontrar pistas que apontam para um tempo de intensas transformações sociais, como a transição do trabalho escravo para o assalariado e da monarquia para a república.

Primeiro livro de autoria feminina da Série Memórias Fluminenses

O objetivo da Série Memórias Fluminenses, da Essentia Editora, é a publicação ou republicação de livros referenciais para a história, a memória e as identidades culturais no âmbito das regiões de atuação do Instituto Federal Fluminense. “Buscamos recuperar esse nome feminino da literatura regional, com textos que nos trazem pistas sobre um período ainda pouco conhecido e estudado do noroeste fluminense, como foram as últimas décadas do século XIX. É um livro muito especial porque é uma obra rara e também por ser o primeiro de autoria feminina que nós estamos publicando dentro da Série. Também é especial porque faz essa relação da literatura com a memória e a história da região”, destaca Paula Borges Bastos. Rumorejos do Monte Himalaya está disponível para leitura, gratuitamente, assim como as outras publicações da Série, pela Essentia Editora do IFF.

No lançamento, conversamos com uma das organizadoras a respeito da obra:

IFF: Qual é a contribuição desse livro para os dias atuais? A autora, Amelia, pode ser vista como uma mulher que rompeu com paradigmas e saiu do contexto do lar para a literatura, para exercer uma função que talvez fosse vista com preconceito na época em que ela viveu, no século XIX?

Paula: Os estudos sobre mulheres escritoras no século XIX ainda estão iniciando, apesar de grandes avanços nas últimas décadas. Existiam muitas mulheres escritoras naquele período, mas o que se compreende hoje é que elas muitas vezes são desconhecidas por serem esquecidas. Muitas escreviam para jornais que naquela época tinham grande influência junto ao público feminino leitor. Então existia também essa característica de querer ter algumas mulheres escrevendo para mulheres. Amelia tem uma singularidade: apesar de ela não ser aquilo que se considera feminista, como nos termos atuais, ela teve uma linha de vida muito singular porque numa época em que a educação na região noroeste fluminense era ainda muito incipiente – não só para mulheres – e o público letrado era muito pequeno na região, ela foi enviada para a capital do Rio de Janeiro pela família para estudar, o que não era comum na época por ser caro, difícil, e ela e a irmã tiveram esse privilégio. E ali elas aprenderam diversas línguas, tiveram uma educação muito ampla, o que possibilitou ter toda essa trajetória cultural. Quando ela retorna para a fazenda, começa a escrever porque tinha esse reconhecimento local dessa formação cultural. Ela era filha de fazendeiro local, e traz isso em seus escritos, apesar de ser muito voltada para o valor da educação, para o valor do conhecimento. E, nesse sentido, ela estimulava e pensava – em outros escritos ela aponta isso – a questão de uma mulher que reflete sobre as questões sociais e econômicas. Ela não era aquilo que a gente chamaria de uma “sinhazinha”, apesar de não ser uma mulher que tivesse grandes questões revolucionárias. Mas ela teve um papel muito importante no seu tempo para a sua região.

IFF: Amelia representava resistência simplesmente pelo fato de ser uma mulher inserida no meio literário no século XIX?

Paula: O que a gente sabe é que Amelia foi muito reverenciada como escritora e mulher, pois num período em que não havia educação tão ampla, ela acabava se destacando. Ela era uma mulher que, realmente, em outros escritos, fazia uma crítica às mulheres que viviam um cotidiano de simples aceitação, de um viver sem análise crítica, sem atuação no seu mundo. Então, nesse sentido, era uma pessoa muito à frente de seu tempo ou talvez dentro do seu tempo naquele momento de transformações sociais, em que havia mulheres que ainda estavam presas ao início do século XIX, aquele período ainda pré-republicano.

IFF: Qual o cenário, o ambiente social em que a autora e o livro estão inseridos? É um momento de profundas transformações?

Paula: É um livro publicado em 1894, composto por escritos que ela fez em anos anteriores, num ambiente em que há questões como o fim da escravidão para o trabalho assalariado, a transformação da monarquia para a república. Amelia vivencia todo esse período e tem noção de como esse é um momento transitório, de intensas transformações sociais. Como fazendeira, ela se manifesta em relação ao que ela observa sobre questões econômicas na região, ela tem publicações sobre a questão do trabalho rural e dos trabalhadores rurais que acabam sendo publicadas no país inteiro. Ela se manifesta sobre a questão da imigração. E a fazenda da família da Amelia procura se adaptar a esses tempos de transição, com formas de parcerias, também tendo imigrantes colonos portugueses. O pai dela havia falecido recentemente e Amelia e a mãe passam a tomar conta da fazenda, e não era comum na época que as mulheres assumissem essa função. Ela era muito ativa e muito observadora das questões econômicas e das transformações que aconteciam. Ela demonstra claramente que os fazendeiros da época tinham que se adaptar a esse momento e tinham que saber enfrentar essas questões.

IFF: Rumorejos do Monte Himalaya é um livro raro, especialmente por haver poucos registros históricos da região noroeste fluminense?

Paula: Essa obra é rara por dois aspectos. O primeiro é o livro em si, dificílimo de ser encontrado, então o livro é uma obra rara. Existia um exemplar com a família, os descendentes da autora. Existem alguns exemplares no Real Gabinete Português de Leitura, porque a família dela é descendente de açoreanos, e na Academia Brasileira de Letras, onde está registrado como um livro raro, de fácil acesso. Para Memórias Fluminenses, é um livro muito especial porque é o primeiro de autoria feminina que nós estamos publicando dentro da Série e também porque ele faz essa relação da literatura com a memória e a história da região, e Amelia traz pistas do que era esse momento social e histórico, um período sobre o qual temos poucos registros documentais, até mesmo a respeito das questões culturais da época.

Saiba mais sobre a Série Memórias Fluminenses: a Série faz parte do Programa Centros de Memória do IFF e tem como objetivo a publicação de livros referenciais para a história e as identidades culturais no âmbito das regiões de atuação do Instituto. Seus volumes normalmente mantêm a ortografia da época da primeira publicação e a transcrição do conteúdo do livro original, a fim de garantir ao leitor o acesso mais próximo possível de uma transcrição fiel ao texto original.

O livro Rumorejos do Monte Himalaya está disponível para download AQUI.

Ascom da Reitoria do IFF BJI

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